Total 90s - XXXIV

Neste mês: tudo o que “o bacano” queria era o seu tapete de volta; uma série juvenil salva pelo gongo; uma canção sobre a Laura que não está e cavaleiros da távola redonda de partida à aventura.

Filme: ‘O Grande Lebowski’The Big Lebowski (1998)

Jeff Lebowski (Jeff Bridges) é um entusiasta jogador de bowling e cujos parceiros são o veterano do Vietname, Walter Sobchak (John Goodman), neurótico e divorciado, e Donny Kerabatsos, um grande jogador do desporto mas que ninguém deixa falar. Certo dia, Lebowski vê a sua casa arrombada por dois gangsters que julgam estar perante o multimilionário Jeffrey Lebowski (David Huddleston), no intuito de reaver a dívida que a sua mulher Bunny (Tara Reid) tem para o pornógrafo Jackie Treehom (Ben Gazzara). Mas enganaram-se, urinaram no tapete e bateram na porta errada, este não passa de um desempregado ocioso que se auto-intitula "The Dude". O seu azar é tanto que, quando Walter o convence a visitar o tão procurado Lebowski, em vez de receber a tão esperada recompensa vê-se envolvido no rapto da mulher deste.

Livremente baseado no romance de ficção policial ‘The Big Sleep’ (1939), de Raymond Chandler, os irmãos Joel e Ethan Coen escreveram ‘O Grande Lebowski’ sensivelmente na mesma época que ‘Barton Fink’ (1991). Quando quiseram avançar com o filme, John Goodman estava a filmar episódios de ‘Roseanne’ e Jeff Bridges estava a rodar ‘Wild Bill’ (1995), o que os levou entretanto a realizar o aclamado ‘Fargo’ (1996). O protagonista “The Dude” (uma espécie de “O Bacano”, em português) é inspirado principalmente em Jeff Dowd, um produtor norte-americano de cinema e activista político que os irmãos Coen conheceram enquanto tentavam encontrar distribuição para a sua primeira longa-metragem,’ Sangue por Sangue’ (1984). Dowd gostava de beber white russians e era conhecido como "Dude".

‘O Grande Lebowski’ não arrecadou grande receita de bilheteira nos Estados Unidos, passando algo despercebido nas salas de cinema. Recebeu críticas mistas à época do seu lançamento mas, com o passar do tempo, as análises tornaram-se francamente elogiosas e a obra recebeu o estatuto de filme de culto. Estão lá todas as imagens de marca do cinema dos Coen: a atenção à linguagem e aos diálogos pouco convencionais, o meio social enfadonho transformado em mundo etéreo, um rico elenco de personagens idiossincráticas perfeitamente situadas entre o excesso e o discernimento, sequências de fantasia e uma banda sonora ecléctica.

Já admirava a obra dos irmãos Coen desde o tempo do anteriormente referido ‘Fargo’ e por filmes posteriores como ‘Este País Não É para Velhos’ (2007) e ‘Indomável’ (2010) mas ‘O Grande Lebowski’ andou a iludir-me por vários anos sem saber o que estava a perder. A abordagem abstracta à realidade por parte dos Coen resulta numa comédia negra que mesmo com alguma violência e excessos caricaturais não perde o aspecto humano no seu todo. Como o tapete do “Dude” que “compunha mesmo todo o quarto”.

Série: ‘Já Tocou!’ - Saved by the Bell (1989-1993)

‘Já Tocou!’ é uma sitcom norte-americana que estreou em 1989 na NBC e que prolongou-se por quatro temporadas, tendo dado origem a vários spin-offs, sequelas e filmes após a sua conclusão. Criada por Sam Bobrick, a série orientada para um público mais juvenil deve a sua origem a ‘Good Morning, Miss Bliss’, outra sitcom adolescente idealizada por Bobrick, que foi produzida pela NBC e transmitida pelo Disney Channel no ano anterior. ‘Good Morning, Miss Bliss’ foi cancelada após 13 episódios e a NBC recuperou os direitos da série, reformatando-a como ‘Saved by the Bell’, a designação original que em Portugal recebeu a tradução de ‘Já Tocou!’. As personagens Zack, Screech, Lisa e Mr. Belding fizeram a transição para a nova série, que colocou a acção no subúrbio fictício de Bayside, na Califórnia.

A série é predominantemente passada numa escola secundária, a Bayside High School, onde os seus estudantes se aventuram em temas próprios da adolescência. Concentrando-se principalmente em situações cómicas, ‘Já Tocou!’ ocasionalmente aborda também questões sociais sérias, como o uso de drogas, condução alcoolizada, o drama dos sem-abrigo, divórcio, morte, direitos das mulheres e questões ambientais. As personagens são estereótipos bastante comuns e frequentes nas séries e filmes norte-americanos mas isso não impediu que ‘Já Tocou!’ tivesse boas audiências ao longo das suas quatro temporadas e 86 episódios, conseguindo atrair miúdos e graúdos.

O produtor Peter Engel foi o responsável por desenvolver as personagens e centrou a série nas peripécias de seis delas. Zach Morris (Mark-Paul Gosselaar) assume o protagonismo pela capacidade de quebrar a “quarta parede” e falar directamente para a câmara. É preguiçoso, um péssimo aluno e está sempre à procura do caminho mais fácil. Kelly Kapowski (Tiffani Thiessen) é a rapariga mais popular da escola e líder da claque. A.C. Slater (Mario Lopez) é o atleta da turma, filho de um militar e recentemente transferido para Bayside. Jessie Spano (Elizabeth Berkley) é a delegada de turma e a melhor amiga de Zach. Samuel "Screech" Powers (Dustin Diamond) é o “cromo” do grupo e o melhor aluno da escola. Lisa Turtle (Lark Voorhies) é a miúda rica da turma e uma apaixonada por moda. A encabeçar todos as personagens secundárias está Mr. Belding (Dennis Haskins), o director de Bayside que os alunos tentam frequentemente evitar e com quem Zach choca de frente múltiplas vezes.

‘Já Tocou!’ foi umas primeiras séries que a TVI transmitiu desde que a segunda estação de televisão privada em Portugal iniciou as suas emissões a 20 de Fevereiro de 1993. A entrar na adolescência, a série cativou-me e chegava a gravar episódios para revê-los mais tarde. Os desenhos animados já não me entusiasmavam como antes e ‘Já Tocou!’ foi uma espécie de ‘Morangos com Açúcar’ da altura para mim, embora mais focada na comédia de situação. Para além dos spin-offs e telefilmes que se seguiram à série original, uma nova ‘Saved by the Bell’ estreou em 2020 na plataforma de streaming Peacock e contou com a presença (mais ou menos pontual) de todos os protagonistas veteranos com a excepção de Dustin Diamond, que faleceria um ano mais tarde.

Álbum: ‘Lei, gli amici e tutto il resto’ – Nek (1997)

Filippo Neviani, mais conhecido pelo seu nome artístico Nek, é um músico italiano nascido em 1972 na cidade de Sassuolo, província de Modena. Começou por tocar bateria, baixo e guitarra aos nove anos de idade, influenciado inicialmente por John Denver e mais tarde por Sting. No final dos anos 80 integrou bandas como os Winchester e White Lady até se lançar a solo, como cantor e compositor, em 1991. O seu primeiro álbum data de 1992 e intitulou-se simplesmente ‘Nek’, estreando-se no prestigiado Festival de Música de Sanremo no ano seguinte com uma canção um tanto controversa que fala do aborto, ‘In te (il figlio che non vuoi)’ e alcançando o terceiro lugar na categoria de “Novas Propostas”.

Nek obteve sucesso internacional pela primeira vez em 1997, quando regressou a Sanremo, agora na secção “Grandes Artistas”, com a música ‘Laura non c'è’. A canção revelou-se um grande sucesso na Europa e na América Latina naquele ano. Como consequência do seu momento de fama, o seu álbum ‘Lei, gli amici e tutto il resto’ do ano anterior foi reeditado pela Warner Music de forma a incluir ‘Laura non c'è’ como single de destaque. O quarto álbum do músico italiano vendeu mais de dois milhões de cópias a nível mundial e foi o seu primeiro trabalho de originais a também merecer uma edição gravada em castelhano, situação que se repetiria praticamente em todos os discos seguintes.

‘Lei, gli amici e tutto il resto’ (traduzível para português como “Ela, os amigos e tudo o resto”) foi produzido por Rolando D'Angeli e na sua reedição de 1997 originou mais três singles: ‘Sei grande’, ‘Tu sei, tu sai’ e ‘Dimmi cos'è’. Nek comentaria mais tarde que a sua inexperiência anterior e a busca por uma identidade musical levaram-no a mudar de editora discográfica e provocaram uma mudança de estilo musical do pop italiano tradicional para um som mais pop rock anglo, resultando no seu sucesso repentino. Actualmente, o cantor transalpino já leva 13 álbuns de estúdio e 48 singles lançados ao longo da carreira, com vendas estimadas de mais de 10 milhões de discos.

De todos os CD que comprei, ‘Lei, gli amici e tutto il resto’ terá sido o mais “arriscado”. Só conhecia ‘Laura non c'è’ por passar nas rádios nacionais e nunca antes tinha ouvido falar de Nek. O meu gosto pela língua italiana e pela música de Jovanotti (e também algumas canções de Laura Pausini e Eros Ramazzotti) levou-me a arriscar o “tiro no escuro” e devo dizer que não me arrependi até hoje. É um álbum de que gosto muito, com várias músicas até mais rock do que pop e onde não encontro faixas que queira saltar na leitura do CD.

Videojogo: ‘Knights of the Round’ (1991)

O jovem Arthur Pendragon, que estava a treinar para ser um grande cavaleiro, conseguiu retirar a espada sagrada Excalibur que estava encrustada numa rocha. Depois de retirá-la, Arthur percebeu que o seu destino era tornar-se o primeiro rei dos bretões. O mago Merlin envia então Arthur e os seus dois companheiros mais próximos, Lancelot e Perceval, para derrubar o malvado rei Garibaldi, recuperar o Santo Graal e unir a Grã-Bretanha.

Baseado livremente na lenda do Rei Artur e dos Cavaleiros da Távola Redonda, o jogo foi desenvolvido e publicado em 1991 pela japonesa Capcom. A jogabilidade segue a linha de outros beat 'em ups de sucesso da empresa nipónica, tais como ‘Final Fight’ (1989) e ‘The King of Dragons’ (1991). O jogo apresenta sete níveis, cada um com o seu próprio boss e uma variedade de inimigos genéricos que tentam impedir o progresso dos jogadores. As lutas dependem fortemente da capacidade de bloqueio, que é accionada pressionando o botão de ataque e, em seguida, afastando o joystick conforme o oponente ataca. Como na maioria dos beat 'em ups, um ataque “desesperado” é executado pressionando os botões de ataque e salto simultaneamente. Isso mata a maioria dos inimigos no ecrã, mas o jogador perde um pouco de energia cada vez que o usa. Em vários pontos do jogo, os jogadores montam um cavalo, onde podem atacar os inimigos dessa forma. Ocasionalmente, bosses e certos personagens inimigos também podem andar a cavalo.

Lançado originalmente para as máquinas arcade e, face ao sucesso comercial, três anos mais tarde para a Super Nintendo, ‘Knights of the Round’ permite jogar com qualquer um dos três lendários guerreiros. O Rei Artur, o herói principal, é uma personagem bem equilibrada em velocidade e força. A sua arma é a espada Excalibur com a qual pode realizar um ataque especial. Sir Lancelot é um espadachim talentoso e é a personagem mais rápida, mas carece de força. O seu ataque especial é o pontapé aéreo e a sua arma de eleição é um sabre. Por fim, Sir Perceval, filho de um ferreiro, prefere usar um machado de batalha como sua arma principal. É a personagem mais forte, em detrimento de agilidade, e o seu ataque especial consiste num movimento rotativo devastador. O jogo apresenta um sistema de avanço de nível semelhante ao de um videojogo de RPG de acção, com os lutadores a serem automaticamente actualizados para novas armas e armaduras à medida que avançam no jogo.

Assim como a literatura em que é baseado o jogo apresenta inúmeras histórias lendárias do tempo do Rei Artur e dos seus contemporâneos, também ‘Knights of the Round’ arriscou tornar-se para mim uma espécie de mito pois nunca o consegui jogar enquanto criança ou adolescente. Vi o jogo pela primeira vez numa máquina arcade na antiga Feira Popular de Lisboa, à qual ia com a minha família cerca de uma vez por ano. E cada vez que me acercava da máquina com o jogo esta estava ocupada, às vezes até com alguém já à espera de jogar a seguir. É certo que o jogo permitia até três jogadores em simultâneo mas nem isso me garantiu um lugar. Três décadas depois, finalmente consegui jogá-lo através do conjunto de jogos ‘Capcom Beat 'Em Up Bundle’ para a PS4 e, apesar de já não ter o encanto de outrora, ainda foi divertido.